quinta-feira, março 08, 2007

O teu riso



Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

Pablo Neruda

Foto:Frédéric Karikese

5 comentários:

papagueno disse...

Cá estou de volta e com um belo poema de Neruda. Sabes estou triste; vou ser despejado do Bairro do Amor. Beijinho.

Maria Carvalho disse...

Fantástico poema de Neruda! Senti-o como se tivesse sido escrito para mim...quando o amor toma forma, o riso é especial! Beijos.

António disse...

Querida Isabel!
Espero que estejas bem.
Magníficos estes últimos poemas que aqui colocaste.
Obrigado pelo teu comentário à história do cego.
Eu tinha que a acabar porque senão deixava de ser uma história curta...ah ah ah.
Eu sei que a esquizofrenia pode ser estabilizada.
Tenho um velho amigo da escola primária e do liceu que se revelou doente aos 18 anos.
Depois de muito ter passado e se ter tentado suicidar, acabou por casar e hoje já tem uma filha adolescente.
Conseguiu controlar a doença e já tem 58 anos.
Na história, não entrei por aí porque senão teria de estudar sobre o assunto.
Deixei aos leitores a possibilidade de não conhecerem muito sobre os tratamentos, ou de considerarem que havia desleixo ou falta de dinheiro para medicamentos ou ainda que a história se passou há bastantes anos, pois eu não a localizei no tempo nem no espaço.
Falei e disse!

Beijinhos

PintoRibeiro disse...

Bom dia e bjinho Isabel.

achama / Sonia R. disse...

Gostei muito deste riso. Bom dia Isabel.

Bjinho.