quarta-feira, março 07, 2007

Arte poética com citação de Holderlin



O poema lírico nasceu de uma roseira. Não
digo que fosse a rosa de cima, aquela que todos
olham, primeiro que tudo, pensando
em cortá-la para a levarem consigo. É
a rosa nem branca nem vermelha, a rosa pálida,
vestida com a substância da terra
a que toma a cor dos olhos de quem a fixa, por
acaso, e ela agarra, como se tivesse
mãos abstractas por dentro das suas folhas.

Colhi esse poema. Meti-o dentro de água,
como a rosa, para que flutuasse ao longo de um rio
de versos. O seu corpo, nu como o dessa mulher
que amei num sonho obscuro, bebeu a seiva
dos lagos, os veios subterrâneos das humidades
ancestrais, e abriu-se como o ventre da
própria flor. Levou atrás de si os meus olhos,
num barco tão fundo como a sua própria
morte.

Abracei esse poema. Estendi-o na areia
das margens, tapando a sua nudez com os ramos
de arbustos fluviais. Arranquei os botões
que nasciam dos seus seios, bebendo a sua cor
verde como os charcos coalhados do outono. Pedi-lhe
que me falasse, como se ele só ainda soubesse
as últimas palavras do amor.

(Metáfora contínua de um único sentimento).

Nuno Júdice

Foto:Eric Kellerman

7 comentários:

Maria Carvalho disse...

Excelente! Sem palavras...beijos.

Fatyly disse...

Gostei!
Beijos

PintoRibeiro disse...

Soberbo Isabel e nada como começar o dia com a referência a Holderlin. Bjinho.

Gi disse...

Magnífico. Como aliás, é quase tudo o que conheço dele.

beijinhos

poetaeusou . . . disse...

*
Perdão, Erico de Verissimo

não, não é,
Olhai os Lírios do Campo.

mas sim,

Olhái os Lírios da Wind.

diários, sublimes.
***

bls)
++++++++++++

Bernardo Kolbl disse...

Melhor espero ãté porque não chove e está sol. Abraço Wind.

lena disse...

Wind, também eu abracei o poema, e deixei-o falar

Nuno Júdice encanta-me


uma escolha perfeita, menina linda


beijinhos muitos para ti e um abraço com ternura

lena