terça-feira, março 25, 2008

A morte da água



Um dos passeios que mais gosto de dar é ir a esposende ver desaguar o cávado. Existe lá um bar apropriado para isso. Um rio é a infância da água. As margens, o leito, tudo a protege. Na foz é que há a aventura do mar largo. Acabou-se qualquer possível árvore geneológica, visível no anel do dedo. Acabou-se mesmo qualquer passado. É o convívio com a distância, com o incomensurável. É o anonimato. E a todo o momento há água que se lança nessa aventura. Adeus margens verdejantes, adeus pontes, adeus peixes conhecidos. Agora é o mar salgado, a aventura sem retorno, nem mesmo na maré cheia. E é em esposende que eu gosto de assistir, durante horas, a troco de uma imperial, à morte de um rio que envelheceu a romper pedras e plantas, que lutou, que torneou obstáculos. Impossível voltar atrás. Agora é a morte. Ou a vida.

Ruy Belo

Imagem daqui

4 comentários:

António disse...

Bonito texto!

Beijinhos

papagueno disse...

Para mim a água é sempre vida.
Concordo, bonito texto.
Beijos

Paula Raposo disse...

Por vezes, quando leio, penso como gostaria de ter conhecido pessoalmente quem escreveu...seria um privilégio. Um texto belíssimo.

Fatyly disse...

Por acaso conheço bem essa foz e é tão agradável beber um sumol de laranja a ver a foz desse rio.

Quando a maré vasa, é hábito as vacas irem pastar para o meio do rio mas distraidas como são, não dão por ele encher devido ao mar e lá ficam as desgramadas até que o leito do rio volte a baixar.

Vi diversas vezes e nem queria acreditar no que via. Já lá vão doze anos mas ainda hoje contam-me que é a mesmissima coisa:)

Ruy Belo um amante da natureza e "ou a vida" que ela encerra.

Beijos