sexta-feira, março 28, 2008

Letra: Ferida exposta ao tempo



É forçoso dizer que me faz falta
o poema que existe e nunca li,
como se alhures
brotassem coisas que não vi
e que distantes,
carentes,
dependessem de mim.

Algo como se o intocado fosse a sinfonia
inacabada, mais:rasgada
como o quadro nunca esboçado, perdido
na abatida mão do artista.

O ausente
é uma planta
que na distância se arvora
e é tão presente
quando o passado que aflora.

E a literatura, mais que avenida ou praça
por onde cavalga a glória, é um monumento,
sim, de dúbia estória: granito e rima,
alegoria ao vento, lugar onde carentes
e arrogantes
cravamos nosso nome de turista:
-estive aqui, desamado,
riscando a pedra e o tempo
expondo meu sangue e nome
com o coração trespassado.

Affonso Romano de Sant'Anna

Foto:Dirk Vermeirre

3 comentários:

papagueno disse...

A prwesença da ausência.
Um beijo

Paula Raposo disse...

Muito belo!

Mãe Galinha disse...

Em boa hora descobri o teu blog!
Parabéns :-)