terça-feira, julho 10, 2007
Ponto de orvalho
Nem se chega a saber como
um inusitado sorriso,
um volver de olhos doentes,
um caminhar indeciso
e cego por entre as gentes,
chamam a si, aglutinam,
essa dor que anda suspensa
(e é dor de toda a maneira)
como o vapor se condensa
sobre núcleos de poeira.
É essa angústia latente
boiando no ar parado
como um trovão iminente,
que em muda voz se pressente
num simples olhar trocado.
Essa angústia universal,
esse humano desespero,
revela-se num sinal,
numa ferida natural
que rói com lento exagero.
Não deita sangue nem pus,
não se mede nem se pesa,
não diz, não chora, não reza,
não se explica nem traduz.
A gente chega, respira,
olha, sorri, cumprimenta,
fala do frio que apoquenta
ou do suor que transpira,
e pronto, sem saber como,
inútil, seco, vazio,
cai na penumbra do rio,
emerge, bóia, soçobra,
fácil e desinteressado
como um papel que se dobra
por onde já foi dobrado.
António Gedeão
Foto:Petek Arici
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10 comentários:
Wind,
miga.....venho deixar-te um enorme beijo, pois vou de férias......e ainda nao sei quando regresso!!
Sempre que puder aceder á net, o teu espaço será obrigatóriamente o meu espaço.....porque ler-te....é algo de insubstituivel!
Gracias guapita por seres como és!
Até breve!
Este poema tem tanto da nossa melancolia portuguesa. Lindíssimo!
Acho que já disse aqui que o Gedeão está no top das minhas preferâncias poéticas.
Um grande poeta que me não entra, infelizmente.
Bjinho Isabel. Melhor.
Engraçado acabo de chegar do pequenos nadas e ver algumas fotos magníficas aobre o orvalho e agora deparo-me com este belo poema do grande Gedeão.
Beijinhos
Olá Wind:
Achei piada ao teu comentário no Xanax e resolvi visitar-te, gosto de gente com sentido de humor.
Gosto de Gedeão e deixo-te aqui o meu poema preferido dele:
Eu sei que o meu desespero não interessa a ninguém.
Cada um tem o seu, pessoal e intransmissível:
com ele se entretém e se julga intangível.
~
Eu sei que a Humanidade é mais gente do que eu,
sei que o Mundo é maior do que o bairro onde habito,
que o respirar de um só, mesmo que seja o meu,
não pesa num total que tende para infinito.
~
Eu sei que as dimensões impiedosas da Vida
ignoram todo o homem,
dissolvem-no, e, contudo,
nesta insignificância, gratuita e desvalida,
Universo sou eu, com nebulosas e tudo.
~
António Gedeão - Amostra Sem Valor
Beijinho e uma excelente semana.
Nota: E adoro o Che!
Wind,
Ainda mal tinha começado a ler e já sabia que só podia ser Gedeão. Pouco depois, identifiquei o poema. Um dos muitos belos poemas desse céptico professor.
Boa semana e um beijo.
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LINDA
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O MEU BLOG ESPERA-TE
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JI
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Complexo como complexo é o sentir do ser humano. Gostei!
Parabéns pelas fotos sempre as mais adequadas e belas.
Beijos
Excelente este poema do Gedeão. Beijos.
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