quinta-feira, novembro 16, 2006

Truque ao meu amigo de rua



Ao acaso encontrei-te encostado a uma esquina
olhar vazio varrendo a multidão, parei
sorri e tu vieste, fomos andando
os ombros tocavam-se, em direcção a casa
pediste-me para tomar um duche, eu deitei-me
ouvi o barulho da água resvalando pelo teu corpo sujo da
cidade e de engates
sujo pelos dias e noites e mais dias que não tive
esperei-te deitado, outro cigarro
e ainda espero
gosto dos corpos que riem, frescos
rasgam-se à ternura nocturna dos dedos, e ao desejo
húmido da boca, que sempre percorre e descobre

tacteio-te de alto a baixo
reconhecendo-te num gemido que também me pertence,
no escuro
contaste-me uma improvável aventura de tarzan, ouvia-te
e no silêncio do quarto fulguravam aves que só eu via
sorri ao enumerar os restos que a manhã encontraria pelo
chão
manchas de esperma, ténis esburacados, calças
sujíssimas, blusão cheio de autocolantes, peúgas
encortiçadas pelo suor
as cuecas rotas, sujas de merda
e tuas mãos, recordo-me
sobretudo de tuas mãos imensas sobre o peito
teu corpo nu, à beira da cama, no sossegado sono

Al Berto

Foto:Joris Van Daele

5 comentários:

Nilson Barcelli disse...

O Al Berto é homossexual? Ou será que se colocou na pele de um homossexual para escrever o poema?
As tendências sexuais que ele tem, no entanto, não têm qualquer influência no valor do poema e da excelente poesia que ele faz.
Mas a leitura causou-me alguns arrepios... eu aceito tudo, mas há sensações que são superiores à razão...
Ou será que não percebi nada?
Beijos.

JPD disse...

Já mais de uma vez entrei na FNAC para comprar poesia e fiquei sempre indeciso entre este autor e a aquisição que acabava por fazer adiando Al Berto.
Hei-de voltar à FNAC
Bjs

António disse...

Olá, Isabel!
Mais uma série de novas poesias.
São tantas que muitas vezes nem se consegue ler todas.
No meio aparece um post com uma polémica: deixa-me que te diga que fica mal no meio de tanto poema de qualidade.
Obrigado pela tua visita e comentário.

Beijinhos

(em resposta ao "nilson barcelli", posso dizer que o Al Berto era, de facto, homossexual, e assumido; lembro-me de há uns anos o ver num debate televisivo nessa qualidade e não da de poeta)

Nilson Barcelli disse...

Wind e António:
Obrigado pelos vossos esclarecimentos.
A verdade é que até há cerca de um ano e meio, altura em que comecei a tentar escrever poemas, nunca gostei de ler poesia. Li muito pouco, por isso, quase se resumindo a ler os autores obrigatórios da escola.
Daí para cá já li muita coisa, incluindo do Al Berto, mas nunca me dei ao trabalho, por falta de tempo, de ler alguma coisa sobre os autores.
Mas com vocês aprendo sempre alguma coisa...
Obrigado, mais uma vez.

wind disse...

António o post da polémica apareceu, porque tinha de aparecer.
E pedi desculpa a quem lê o blog, mas tinha de ser feito para acabar de vez com o assunto!

Nilson, o grande poeta Al Berto era homossexual e morreu de linfoma.