sábado, janeiro 14, 2006

Soneto de Áspera Resignação



Não me digas segredos nessa voz
em que dizes também o que não dizes.
Fica o silêncio ainda mais atroz
depois de entremostradas as raízes.

Prefiro que não digas nada, nada.
Que não sejas arbusto nem canção,
mas sombra entreaberta, recortada
por um lívido e breve coração.

Já que não podes dar-me o que eu sonhara
- inteireza de ramos e raiz -,
ao menos dá-me, intacta, a sombra clara
onde se esbatam vultos e perfis.

Pois nesta solidão melhor é ter
a sombra que um segredo de mulher.

David Mourão-Ferreira

Foto:Paul Bolk

2 comentários:

Mocho Falante disse...

Prefiro que não digas nada, nada.
Que não sejas arbusto nem canção,
mas sombra entreaberta, recortada
por um lívido e breve coração.

é lindo...lindo

Cristina disse...

Wind,
Muito lindo, aliás como todos os poemas que escolhes e as imagens
:)
tem um lindo fim de semana
beijinhuu