quarta-feira, maio 24, 2006

Corpo invisível



Eram perdas antecipadas
que fio a fio desfilavam à sua frente
com as cãs de aço enroscando-se
na escova inútil,
pensava Carlos diante do espelho

Poro a poro aos poucos fechando-se
a vida se esvaía no sono ingênuo do tempo
na carícia leve e branca
da juventude ultrajada

Célula a célula, maduras pétalas feneciam
imperceptivelmente
como corolas invisíveis que o estio resseca
após a primavera
impiedosamente

Era assim que Carlos assistia o avanço
inexorável das idades na superfície vesga
do espelho no pulsar distante das estrelas
que grudam na escuridão do mundo

Pupilas de antigo brilho sem cristais
feita de lágrimas o jorro final
a refulgir no espelho inócuo
o vigor que se precipita no abismo.

Carlos Tavares

Foto:Gianni Candido

1 comentário:

Alien8 disse...

Olá Wind,
Tens aqui uma bela interpretação do "Summertime"!
Beijinhos.