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Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Nota à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo:Fui eu?
Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa
Foto:Manuel Carlos
2 comentários:
Passo ver as tuas edições e dar-te as boas noites.
Bela selecção poética.
Especial abraço.
Boa noite
Muitas, ele tinha nuitas almas. Por isso também era tão dividido. beijinhos
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