terça-feira, março 07, 2006

Ode à incompreensão



De todas estas palavras não ficará, bem sei,
um eco para depois da minha morte
que as disse vagarosamente pela minha boca.
Tudo quanto sonhei, quanto pensei, sofri,
ou nem sonhei ou nem pensei
ou apenas sofri de não ter sofrido tanto
como aterradamente esperara -
nenhum eco haverá de outras canções
não ditas, guardadas nos corações
alheios, ecoando abscônditas ao sopro do poeta.

Não por mim. Por tudo o que, para ecoar-se,
não encontrou eco. Por tudo o que,
para ecoar, ficou silencioso, imóvel -
- isso me dói como se ausência a música
não tocada, não ouvida, o ritmo suspenso,
eminente, destinado, isso me dói
dolorosamente, amargamente, na distância
do saber tão claro, da visão tão lúcida,
que para longe afasta o compassado ardor
das vibrações do sangue pelos corpos próximos.

Tão longe, meu amor, te quis da minha imperfeição,
da minha crueldade, desta miséria de ser por intervalos
a imensa altura para que me arrebatas
- meu palpitar de imagem à beira da alegria,
meu reflexo nas águas tranquilas da liberdade imaginada-,
tão longe, que já não meus erros regressassem
como verdade envenenando o dia a dia alheio.

Tão longe, meu amor, tão longe,
quem de tão longe alguma vez regressa?!

E quem, ó minha imagem, foi contigo?

Jorge de Sena

Foto:Stanmarek

4 comentários:

Parrot disse...

Wind,

Regalo ao ouvido esta música.

Boa semana

De Amor e de Terra disse...

Olá minha menina!
Que belo este poema de Jorge de Sena.
Obrigada por o lembrar (relembrar)
Gosto muito da música.
Um beijo de amizade

Maria mamede

Crepúsculo Maria da Graça Oliveira Gomes disse...

Fantástico este poema , é de uma beleza exemplar´. Adorei. beijinhos

Anónimo disse...

Desculpa mas enganei-me na identidade do último comentário deveria ser http://www.bairrodoamor.blog-city.com/
aquele é só um blog de apoio ao Bairro.