domingo, setembro 11, 2005
Carta no caminho
Adeus, porém comigo serás, sempre irás dentro
de uma gota de sangue que circule em minhas veias ou fora,
beijo que me abrasa o rosto ou cinturão de fogo na cintura.
Doce minha, recebe o grande amor que me saiu da vida e que em ti não achava
território como o explorador perdido nas ilhas do pão e do mel.
Eu te encontrei depois da tormenta, a chuva lavou o ar,
na água, teus doces pés brilharam como peixes.
Adorada, me vou a meus combates.
Arranharei a terra para te fazer uma cova e ali teu Capitão te esperará com
flores sobre o leito. Não penses mais, amada,
no tormento que passou entre nós dois como um raio de fósforo nos deixando talvez,
a queimadura.
A paz chegou também porque regresso à luta em minha terra,
e como tenho o coração completo com a parte do sangue que me deste para sempre,
e como levo minhas mãos cheias do teu ser desnudo,
olha-me, pelo mar, que vou radiante, olha-me pela noite que navego,
e o mar e a noite, amor, serão os teus olhos.
Eu não saio de ti quando me afasto.
Agora vou te contar: vai ser tua a minha terra, vou conquistá-la,
não só para te dar, mas para dar a todos, para todo o meu povo.
Um dia o ladrão deixará a sua torre, e o invasor será expulso.
E todos os frutos da vida crescerão em minhas mãos acostumadas antes à pólvora.
E saberei acariciar as novas flores porque tu me ensinaste o que é ternura.
Doce minha, adorada, virás comigo lutar corpo a corpo,
porque em meu coração vivem teus beijos como bandeiras rubras,
e se caio, não só me recobrirá a terra, também o grande amor que me trouxeste,
que viveu circulando por meu sangue. Virás comigo,
e nessa hora te espero, nessa hora e em todas as horas,
em todas as horas te espero.
E quando venha a tristeza que odeio a golpear a tua porta,
diz a ela que te espero, e quando a solidão queira que mudes esse anel em que está meu nome escrito,
diz pra solidão falar comigo, que eu precisei partir porque sou um soldado,
e que ali onde eu estou, sob a chuva ou sob o fogo, amor meu, te espero.
Te espero no deserto mais duro e junto do limoeiro florescido,
em qualquer lugar onde esteja a vida, onde esteja nascendo a primavera, amor meu, te espero. (...)
Pablo Neruda
Imagem daqui Salvador Allende
P.S.:Faz hoje 32 anos que Pinochet tomou o poder no Chile e fez as atrocidades que fez!
P.S.2:Faz hoje também anos que as Torres gémeas se foram.
Imagem daqui
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