sexta-feira, março 05, 2010

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Não há motivo para te importunar a meio da noite,
como não há leite no frigorífico, nem um limite
traçado para a solidão doméstica.

Tudo desaparece. Nada desaparece. Tudo desaparece
antes de ser dito e tu queres dormir descansada. Tens
direito a um subsídio de paz.

Se eu escrever um poema, esse não é motivo para te
importunar. Eu escrevo muitos poemas e tu trabalhas
de manhã cedo.

Toda a gente sabe que a noite é longa. Não tenho o
o direito de telefonar para te dizer isso, apesar dessa
evidência me matar agora.

E morro, mas não morro. Se morresse, perguntavas:
porque não me telefonaste? Se telefonasse, perguntavas:
sabes que horas são?

Ou não atendias. E eu ficava aqui. Com a noite ainda
mais comprida, com a insónia, com as palavras
a despegarem-se dos pesadelos.

José Luís Peixoto

Imagem retirada do Google

5 comentários:

Paula Raposo disse...

Muito bem explicado.
Beijos.

Fatyly disse...

A escrita deste jovem é simplesmente divinal! ADOREI!

Beijocas

António disse...

Goza, Isabel, goza!

ah ah ah

Beijinhos

Politikus disse...

hum.... Recado para alguém!? Gostei...

wind disse...

Não é recado a ninguém:)
O comentário do António é sobre um que deixei no blog dele:)