quinta-feira, outubro 09, 2008
Que país é este? (Fragmento 4)
Minha geração se fez de terços e rosários:
- um terço se exilou
- um terço se fuzilou
- um terço desesperou
e nessa missa enganosa
- houve sangue e desamor. Por isto,
canto-o-chão mais áspero e cato-me
ao nível da emoção.
Caí de quatro
animal
sem compaixão.
Uma coisa é um país,
outra uma cicatriz.
Uma coisa é um país,
outra é abatida cerviz.
Uma coisa é um país,
outra esses duros perfis.
Deveria eu catar os que sobraram
os que se arrependeram,
os que sobreviveram em suas tocas
e num seminário de erradios ratos
suplicar:
- expliquem-me a mim
e ao meu país?
Vivo no século vinte, sigo para o vinte e um
ainda preso ao dezenove
como um tonto guarani
e aldeado vacum. Sei que daqui a pouco
não haverá mais país.
País:
loucura de quantos generais a cavalo
escalpelando índios nos murais,
queimando caravelas e livros
- nas fogueiras e cais,
homens gordos melosos sorrisos comensais
politicando subúrbios e arando votos
e benesses nos palanques oficiais.
Leio, releio os exegetas.
Quanto mais leio, descreio. Insisto?
Deve ser um mal do século
- se não for um mal de vista.
Já pensei: - é erro meu. Não nasci no
tempo certo.
Em vez de um poeta crente
sou um profeta ateu.
Em vez da epopéia nobre,
os de meu tempo me legam
como tema
- a farsa
e o amargo riso plebeu.
Affonso Romano de Sant'Anna
Imagem retirada do Google
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4 comentários:
Um visão realista e crua...infelizmente, certa. Belíssimo poema! Beijos.
Uma visão realista
mas que foi ultrapassada
o estado actual pessimista
também terá a sua derrocada:)
Beijos e um resto de um bom dia
Sou fã deste Affonso!!
Parabéns pelo belissimo blog
Beijos
Belíssimo e com uma excelente imagem.
Bjks
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