segunda-feira, julho 30, 2012

Frente a frente





Nada podeis contra o amor,
Contra a cor da folhagem,
contra a carícia da espuma,
contra a luz, nada podeis.

Podeis dar-nos a morte,
a mais vil, isso podeis
- e é tão pouco!




Eugénio de Andrade


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sexta-feira, julho 27, 2012

Pablo Alborán y Diana Navarro-Solamente tú



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quarta-feira, julho 25, 2012

Apreender com as palavras a substância mais nocturna



Apreender com as palavras a substância mais nocturna
é o mesmo que povoar o deserto
com a própria substância do deserto
Há que voltar atrás e viver a sombra
enquanto a palavra não existe
ou enquanto ela é um poço ou um coágulo do tempo
ou um cântaro voltado para a sua própria sede
Talvez então no opaco encontremos a vértebra inicial
para que possamos coincidir com um gesto do universo
e ser a culminação da densidade
Só assim as palavras serão o fruto da sombra
e já não do espelho ou de torres de fumo
e como antenas de fogo nas gretas do olvido
serão inicialmente matéria fiel à matéria


António Ramos Rosa


Foto:Hubble Site

segunda-feira, julho 23, 2012

O teu nome



Flor de acaso ou ave deslumbrante,
Palavra tremendo nas redes da poesia,
O teu nome, como o destino, chega,
O teu nome, meu amor, o teu nome nascendo,
De todas as cores do dia!

Alexandre O'Neill

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sábado, julho 21, 2012

Extrai todos os dias



Extrai do todos-os-dias
O hoje de todo-o-sempre
Até ao fim do mundo
Quando o sol gelar
A última eternidade.
Embala amanhã nos braços dos outros
A criança esquecida
Que foi agora atropelada
Por mil automóveis
Em todas as ruas do mundo.

Procura nas lágrimas recentes
Os olhos de hão-de chorá-las
Daqui a dez mil anos.

E se queres a glória
De ser ignorado
Pelo egoísmo do futuro
Ouve, poeta do desdém novo:
Canta os mortos das barricadas
E a volúpia das dores do tempo.

(Mas pede às rosas
que continuem a repetir-se
até o fim das pedras…

José Gomes Ferreira

Foto:Eli



quinta-feira, julho 19, 2012

Santana & Indie Arie - While My Guitar Gently Weeps



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terça-feira, julho 17, 2012

O tempo, subitamente solto




O tempo, subitamente solto pelas ruas e pelos dias, 
como a onda de uma tempestade a arrastar o mundo, 
mostra-me o quanto te amei antes de te conhecer. 
eram os teus olhos, labirintos de água, terra, fogo, ar, 
que eu amava quando imaginava que amava. era a tua 
a tua voz que dizia as palavras da vida. era o teu rosto. 
era a tua pele. antes de te conhecer, existias nas árvores 
e nos montes e nas nuvens que olhava ao fim da tarde. 
muito longe de mim, dentro de mim, eras tu a claridade.


José Luís Peixoto


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domingo, julho 15, 2012

Reencontro



Chove pedra.
A pedra dissolve-se
na calçada.
Eu desapareço
em lapsos
como uma desmarcação
de não vida:
e fico pó
e adormeço de novo
no seio quente
de minha mãe.
Sou chuva.
Um reencontro de amor.

Paula Raposo, in"O Laço Impenetrável do Silêncio", pág.17, Chiado Editora

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sexta-feira, julho 13, 2012

Pelo Alto Alentejo-1



Os homens desertaram destas terras.
Só um bacoco,a rufiar com a sombra,
só um bacoco,bolsado das tabernas,
em sete palmos,só,se reencontra.

Turistas fotografam cal e pedras:
o cubismo de casas e ruelas.
Nas soleiras sobraram umas velhas.
Escorre-lhes o preto pelas canelas.

Num caixote com rodas ,meigo tolo,
-um que não veio,aos ésses,lá das Franças,
passar com os velhotes as vacanças-
preso a um fio de cuspo,vende jogo.

Eu e a Teresa procuramos queijo.
O melhor que se traz do Alentejo.


Alexandre O'Neill

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quarta-feira, julho 11, 2012

Sobre a terra



Sei que estou vivo e cresço sobre a terra. 
não porque tenha mais poder, 
nem mais saber, nem mais haver. 
Como lábio que suplica outro lábio, 
como pequena e branca chama 
de silencio, 
como sopro obscuro do primeiro crepúsculo, 
sei que estou vivo, 
vivo sobre o teu peito, 
sobre os teus flancos, 
e cresço para ti. 


Eugénio de Andrade


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segunda-feira, julho 09, 2012

Xutos & Pontapes - Homem do Leme



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sábado, julho 07, 2012

Ternura



Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada, 
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada...

Olho a roupa no chão: que tempestade! 
Há restos de ternura pelo meio, 
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobre veio...


Começas a vestir-te, lentamente, 
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo... 


Mas ninguém sonha a pressa com que nós a despimos 
assim que estamos sós!


David Mourão-Ferreira


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quinta-feira, julho 05, 2012

De palavra em palavra



De palavra em palavra
a noite sobe 
aos ramos mais altos 


e canta 
o êxtase do dia.


Eugénio de Andrade 


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terça-feira, julho 03, 2012

Momento



Chegado o momento
em que tudo é tudo
dos teus pés ao ventre
das ancas à nuca
ouve-se a torrente
de um rio confuso
Levanta-se o vento
Comparece a lua
Entre linguas e dentes
este sol nocturno
Nos teus quatro membros
de curvos arbustos
lavra um só incêndio
que se torna muitos
Cadente silêncio
sob o que murmuras
Por fora por dentro
do bosque do púbis
crepitam-me os dedos
tocando alaúde
nas cordas dos nervos
a que te reduzes
Assim o momento
em que tudo é tudo
Mais concretamente
água fogo música.


David Mourão-Ferreira

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domingo, julho 01, 2012

Para ti daqui



Deixo que me prendas o olhar
em cada beijo que te dou;
um lampejo de sabor a ti,
uma luz que se prolonga em mim.
E eu deixo o olhar prender-se
no regresso à realidade.
Um desencontro ilumina a noite,
e quando a madrugada reaparece
toda a nostalgia chora em sonetos:
és tu que me compões a canção do infinito.

Paula Raposo, in "O Laço Impenetrável do Silêncio", pág.21, Chiado Editora

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