domingo, agosto 24, 2008

O general



("Depois de fortemente bombardeada, a cidade X foi ocupada pelas nossas tropas.")

O general entrou na cidade
ao som de cornetas e tambores ...

Mas por que não há "vivas"
nem flores?

Onde está a multidão
para o aplaudir, em filas na rua?

E este silêncio
Caiu de alguma cidade da Lua?

Só mortos por toda a parte.

Mortos nas árvores e nas telhas,
nas pedras e nas grades,
nos muros e nos canos ...

Mortos a enfeitarem as varandas
de colchas sangrentas
com franjas de mãos ...

Mortos nas goteiras.
Mortos nas nuvens.
Mortos no Sol.

E prédios cobertos de mortos.
E o céu forrado de pele de mortos.
E o universo todo a desabar cadáveres.

Mortos, mortos, mortos, mortos ...

Eh! levantai-vos das sarjetas
e vinde aplaudir o general
que entrou agora mesmo na cidade,
ao som de tambores e de cornetas!

Levantai-vos!

É preciso continuar a fingir vida,
E, para multidão, para dar palmas,
até os mortos servem,
sem o peso das almas.

José Gomes Ferreira

Imagem Retirada do Google

5 comentários:

Lola disse...

Wind,

O ridículo da guerra, a inutil violência e a vã glória...

Magnifíco post.
Beijos

Fatyly disse...

O horror de uma guerra:(

Paula Raposo disse...

Um cruel, real poema...beijinhos.

papagueno disse...

É tão feia a guerra.
Beijos

Alien8 disse...

Wind,

É bom lembrar José Gomes Ferreira, tão injustamente esquecido.

Se bem me lembro, o Francisco Fanhais compôs uma música para este poema, e cantava-o.

Foi também bom teres lembrado Lorca.

E, de um modo geral, gostei de todos os posts que, como de costume, vim ler de um só fôlego :)

Beijos.