terça-feira, agosto 12, 2008

Necrológico dos desiludidos do amor



Os desiludidos do amor
estão desfechando tiros no peito.
Do meu quarto ouço a fuzilaria.
As amadas torcem-se de gozo.
Oh quanta matéria para os jornais.

Desiludidos mas fotografados,
escreveram cartas explicativas,
tomaram todas as providências
para o remorso das amadas.
Pum pum pum adeus, enjoada.
Eu vou, tu ficas, mas os veremos
seja no claro céu ou no turvo inferno.

Os médicos estão fazendo a autópsia
dos desiludidos que se mataram.
Que grandes corações eles possuíam.
Vísceras imensas, tripas sentimentais
e um estômago cheio de poesia...

Agora vamos para o cemitério
levar os corpos dos desiludidos
encaixotados completamente
(paixões de primeira e de segunda classe).

Os desiludidos seguem iludidos,
sem coração, sem tripas, sem amor.
Única fortuna, os seus dentes de ouro
não servirão de lastro financeiro
e cobertos de terra perderão o brilho
enquanto as amadas dançarão um samba
bravo, violento, sobre a tumba deles.

Carlos Drummond de Andrade

Imagem retirada do Google

4 comentários:

Fatyly disse...

Não conhecia esta veia de Drummond e não sei bem o que te dizer...olha já sei...gostei imenso da foto:)

Uma beijoca e um bom dia de chuva que também faz muita falta

António disse...

A faceta feminista do CDA...ah ah ah

papagueno disse...

Pobres desiludidos do amor. Que descansem em paz.
Beijos

Paula Raposo disse...

Fantástico!! Como eu concordo com o Poeta!