segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Fala do homem nascido



Chega à boca da cena, e diz:
Venho da terra assombrada,
do ventre da minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém.
Só quero o que me é devido
por me trazerem aqui,
que eu nem sequer fui ouvido
no acto de que nasci.

Trago boca para comer
e olhos para desejar.
Com licença, quero passar,
tenho pressa de viver.
Com licença! Com licença!
Que a vida é água a correr.
Venho do fundo do tempo;
não tenho tempo a perder.

Minha barca aparelhada
solta o pano rumo ao norte;
meu desejo é passaporte
para a fronteira fechada.
Não há ventos que não prestem
nem marés que não convenham,
nem forças que me molestem,
correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza,
que a Natureza sou eu,
e as forças da Natureza
nunca ninguém as venceu.

Com licença! Com licença!
Que a barca se faz ao mar.
Não há poder que me vença.
Mesmo morto hei-de passar.
Com licença! Com licença!
Com rumo à estrela polar.

António Gedeão

Imagem retirada do Google

3 comentários:

Fatyly disse...

Não há ventos que não prestem
nem marés que não convenham,
nem forças que me molestem,
correntes que me detenham.
.........

Grande poema!!!

Beijocas e um bom dia

Paula Raposo disse...

Gosto imenso deste poema!! Óptima escolha, Isabel.
Beijinhos

Politikus disse...

Um belo poema. apesar de ter levado nas orelhas, há muitoa anos por este poema. 8ª ano do nosso tempo.