terça-feira, maio 06, 2008
José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Carlos Drummond de Andrade
Foto:Piotr Kowalik
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8 comentários:
Não conhecia este poema e realmente é bastante inquietante. Para onde José? ninguém sabe, ninguém adivinha!
Beijos e um resto de dia bom
Wind,
Para onde quando tudo se acaba?
Beijos
Deu-me a sensação de esta poder ser a cavalgada da vida...
Aqui está, incomparavelmente retratada, a vida de muitos Josés...
Mais uma escolha fabulosa que fizeste.
Acho que só uma vez é que não gostei de um poema que aqui publicaste, o que para os anos que já te visito é obra...!
Beijinhos cara amiga.
Bela foto !
Mais uma vida de José, como muitos...
Querida Wind, vou estar afastado da blogoesfera por uns tempos, mas não dispenso as leituras esporádicas das "tuas" poesias"
beijocas
E agora Jos� para onde vamos? Uma pergunta a fazer ao Jos� mais famoso de Portugal, aquele que tem nome de fil�sofo.
;)
Bjks
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