sexta-feira, maio 02, 2008

Desesperança



Esta manhã tem a tristeza de um crepúsculo.
Como dói um pesar em cada pensamento!
Ah, que penosa lassidão em cada músculo. . .

O silêncio é tão largo, é tão longo, é tão lento
Que dá medo... O ar, parado, incomoda, angustia...
Dir-se-ia que anda no ar um mau pressentimento.

Assim deverá ser a natureza um dia,
Quando a vida acabar e, astro apagado,
Rodar sobre si mesma estéril e vazia.

O demônio sutil das nevroses enterra
A sua agulha de aço em meu crânio doído.
Ouço a morte chamar-me e esse apelo me aterra...

Minha respiração se faz como um gemido.
Já não entendo a vida, e se mais a aprofundo,
Mais a descompreendo e não lhe acho sentido.

Por onde alongue o meu olhar de moribundo,
Tudo a meus olhos toma um doloroso aspeto:
E erro assim repelido e estrangeiro no mundo.

Vejo nele a feição fria de um desafeto.
Temo a monotonia e apreendo a mudança.
Sinto que a minha vida é sem fim, sem objeto...

- Ah, como dói viver quando falta a esperança!

Manuel Bandeira

Foto:Gianni Candido

5 comentários:

Paula Raposo disse...

Forte poema de desesperança...beijos.

Lola disse...

Wind,

Manuel Bandeira já doente, mas a escrever belos poemas.

Mas vamos dizer adeus à tristeza.

Tens um café bem aromático com petits fours a acompanhar à tua espera:))

Beijinhos

Fatyly disse...

Muito triste mas não deixa de ser bem real!

Grande poeta!

Beijocas

papagueno disse...

É triste viver sem esperança.
Bjs

António disse...

Um excelente poema!
Curiosamente não aparecem as consoantes mudas...

Beijinhos