sexta-feira, março 19, 2010

Oiço falar



Oiço falar da minha vocação
mendicante e sorrio. Porque não sei
se tal vocação não é apenas
uma escolha entre riquezas, como Keats
diz ser a poesia.
Desci à rua pensando nisto,
atravessei o jardim, um cão
saltava à minha frente,
louco com as folhas do outono
que principiara e doiravam
o chão. A música,
digamos assim,
a que toda a alma aspira,
quando a alma
aspira a ter do mundo o melhor dele,
corria à minha frente, subia
por certo aos ouvidos de deus
com a ajuda de um cão,
que nem sequer me pertencia.

Eugénio de Andrade

Imagem retirada do Google

3 comentários:

Fatyly disse...

Uma ternura e gostei imenso!

Beijos e um bom dia

Paula Raposo disse...

Gostei muito: achei-o um poema doce.
Beijos.

polittikus disse...

Adorei o poema...