domingo, março 14, 2010
Caminharemos de olhos deslumbrados
Caminharemos de olhos deslumbrados
E braços estendidos
E nos lábios incertos levaremos
O gosto a sol e a sangue dos sentidos.
Onde estivermos, há-de estar o vento
Cortado de perfumes e gemidos.
Onde vivermos, há-de ser o templo
Dos nossos jovens dentes devorando
Os frutos proibidos.
No ritual do verão descobriremos
O segredo dos deuses interditos
E marcados na testa exaltaremos
Estátuas de heróis castrados e malditos.
Ó deus do sangue! deus de misericórdia!
Ó deus das virgens loucas
Dos amantes com cio,
Impõe-nos sobre o ventre as tuas mãos de rosas,
Unge os nossos cabelos com o teu desvario!
Desce-nos sobre o corpo como um falus irado,
Fustiga-nos os membros como um látego doido,
Numa chuva de fogo torna-nos sagrados,
Imola-nos os sexos a um arcanjo loiro.
Persegue-nos, estonteia-nos, degola-nos, castiga-nos,
Arranca-nos os olhos, violenta-nos as bocas,
Atapeta de flores a estrada que seguimos
E carrega de aromas a brisa que nos toca.
Nus e ensanguentados dançaremos a glória
Dos nossos esponsais eternos com o estio
E coroados de apupos teremos a vitória
De nos rirmos do mundo num leito vazio.
Ary dos Santos
Imagem retirada do Google
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4 comentários:
O "grito" de Ary que se fosse vivo, ao longo destes 25 anos teria muita "matéria prima" para a sua poesia! Obrigado pela partilha!
Beijocas e um bom domingo
Uma maravilha de poema! Fortíssimo!
Grande Ary!
Beijos, Isabel.
"O Ary" como diz um poeta meu amigo. O grande e eterno. Se fosse vivo, teria os dedos em carne viva com a quantidade de aberrações que gostaría de escrever...
O comentário anterior está mal escrito e pode induzir em erro. As aberrações são a realidade portuguesa actual, não o que ary dos Santos escreve...
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