segunda-feira, novembro 10, 2008

O poema



pouco original do medo
O medo vai
ter tudo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado
de alguns automóveis
Vai ter olhos onde ninguém o veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no teto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos
O medo vai
ter tudo
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
ótimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projetos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos) intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com a certeza a deles
Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados
Ah o medo
vai ter tudo
tudo
(Penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)
O medo vai
ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos
a ratos
Sim
a ratos

Alexandre O'Neill

2 comentários:

Fatyly disse...

Sempre que leio este poema fico confusa. Os ratos reproduzem-se ao minuto, mas daí a medir todos os humanos a ratos devido ao medo...é areia demais para a minha camioneta. É verdade que como animais que somos não há ninguém que não tenha medo de qualquer coisa...mas sinceramente...ratos? jamais serei porque a minha postura perante a vida não é o que leio neste poema, já que quem procede com ganância, vigarice e maldade tombará sempre.

Enfim...:):):):):)

Um abraço do tamanho do mundo, mundo este que, sendo eu um ser vivo e pensante, quero lá saber dos ratos e se os apanho é cacetada pela certa:):):)

Paula Raposo disse...

Nada fácil a leitura deste poema. Beijos.