segunda-feira, agosto 24, 2009
Poema do alegre desespero
Compreende-se que lá para o ano três mil e tal
ninguém se lembre de certo Fernão barbudo
que plantava couves em Oliveira do Hospital,
ou da minha virtuosa tia-avó Maria das Dores
que tirou um retrato toda vestida de veludo
sentada num canapé junto de um vaso com flores.
Compreende-se.
E até mesmo que já ninguém se lembre que houve três impérios no Egipto
(o Alto Império, o Médio Império e o Baixo Império)
com muitos faraós, todos a caminharem de lado e a fazerem tudo de perfil,
e o Estrabão, o Artaxerpes, e o Xenofonte, e o Heraclito,
e o desfiladeiro das Termópilas, e a mulher do Péricles, e a retirada dos dez mil,
e os reis de barbas encaracoladas que eram senhores de muitas terras,
que conquistavam o Lácio e perdiam o Épiro, e conquistavam o Épiro e perdiam o Lácio,
e passavam a vida inteira a fazer guerras,
e quando batiam com o pé no chão faziam tremer todo o palácio,
e o resto tudo por aí fora,
e a Guerra dos Cem Anos,
e a Invencível Armada,
e as campanhas de Napoleão,
e a bomba de hidrogénio,
e os poemas de António Gedeão.
Compreende-se.
Mais império menos império,
mais faraó menos faraó,
será tudo um vastíssimo cemitério,
cacos, cinzas e pó.
Compreende-se.
Lá para o ano três mil e tal.
E o nosso sofrimento para que serviu afinal?
António Gedeão
Imagem retirada do Google
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2 comentários:
Será que se compreende?!! Tenho as minhas dúvidas. Beijos.
Um poema que dá que pensar, porque o poeta se preocupa "lá para o ano três mil e tal"... e quanto ao nosso sofrimento serviu para que enquanto estivermos vivos saibamos diferenciar as coisas.
Ainda hoje não se compreende a história do passado nem do presente e oxalá que continue a compreender-me a mim própria para que possa compreender os outros.
Não disse nada, pois não? é isso lolll
Beijocas miúda e parabéns por descobrires coisas que nunca tinha lido!
BOM DIAAAAAAAAA
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