quarta-feira, agosto 05, 2009

Coração habitado



Aqui estão as mãos.
São os mais belos sinais da terra.
Os anjos nascem aqui:
frescos, matinais, quase de orvalho,
de coração alegre e povoado.

Ponho nelas a minha boca,
respiro o sangue, o seu rumor branco,
aqueço-as por dentro, abandonadas
nas minhas, as pequenas mãos do mundo.

Alguns pensam que são as mãos de deus
— eu sei que são as mãos de um homem,
trémulas barcaças onde a água,
a tristeza e as quatro estações
penetram, indiferentemente.

Não lhes toquem: são amor e bondade.
Mais ainda: cheiram a madressilva.
São o primeiro homem, a primeira mulher.
E amanhece.

Eugénio de Andrade

Foto retirada do Google

4 comentários:

Fatyly disse...

Um belo cântigo ao amor entre dois seres que um toque de mãos vale por mil palavras. Lindissimo e Eugénio será sempre o Eugénio de Andrade!

Beijos e um bom dia

mfc disse...

Mãos... tanto gosto de as olhar!

peciscas disse...

Com máos se faz a paz e faz a guerra.
Com mãos se contrói o amor e o ódio.
E se escrevem poemas absolutos como este.

Paula Raposo disse...

Que beleza de poema! Mestre!! Beijos.