terça-feira, fevereiro 03, 2009
Makezú
O pregão da avó Ximinha
É mesmo como os seus panos,
Já não tem a cor berrante
Que tinha nos outros anos.
Avó Xima está velhinha,
Mas de manhã, manhãzinha,
Pede licença ao reumático
E num passo nada prático
Rasga estradinhas na areia...
Lá vai para um cajueiro
Que se levanta altaneiro
No cruzeiro dos caminhos
Das gentes que vão p'a Baixa.
Nem criados, nem pedreiros
Nem alegres lavadeiras
Dessa nova geração
Das "venidas de alcatrão"
Ouvem o fraco pregão
Da velhinha quitandeira.
- "Kuakiè... Makèzú... Makèzú..."
- "Antão, véia, hoje nada?"
- "Nada, mano Filisberto...
Hoje os tempo tá mudado..."
- "Mas tá passá gente perto...
Como é aqui tás fazendo isso?"
- "Não sabe?! Todo esse povo
Pegó um costume novo
Qui diz qué civrização:
Come só pão com chouriço
Ou toma café com pão...
E diz ainda pru cima
(Hum... mbundo kène muxima...)
Qui o nosso bom makèzú
É pra veios como tu".
- "Eles não sabe o que diz...
Pru qué qui vivi filiz
E tem cem ano eu e tu?"
- "É pruquê nossas raiz
Tem força do makèzú!..."
Viriato da Cruz (Angola)
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5 comentários:
Lindíssimo poema do Viriato. Boa escolha.
Abraço
Obrigada pela partilha. Não sei os significados de algumas palavras. Fica a minha ignorância. Beijos.
Não conhecia o autor, mas gostei do poema.
O que é makèzú...?
Se tivesses colocado uma nota de rodapé...
Beijo.
Aiiiiiiiii como eu gosto tanto deste poema e dos cajús:))))
Ainda oiço no meu coração de menina a minha velha Lemba dizer: meninê Kuakié e como tal..."É pruquê nossas raiz tem força do makézu. No meu imaginário de criança pensava que era um monstro:)))))
..............
Por cá havia os pregões das peixeiras...olhaaaaaa a sardinhaaaaa, etc, etc,
A Avó Xima não a conheci, mas conheci outras que palmilhavam as ruas de Luanda a venderem frutas, milho em massarocas etc. Recordo esse "cajueiro no cruzeiro dos caminhos das gentes que iam para a baixa":)
Já esqueci muito o kibumndo e humbundo, mas assim sei alguma coisinha porque vou anotando para não me esquecer e esta foi fácil:)
Significados:
Quitandeira - vendedora com a quinda(cesta) à cabeça
Kuakiè - amanheceu
Makèzu - é uma mistura de cola e gengibre, para desjejum tradicional, apenas usados pelos kimbandeiros (curandeiros). Melhor dizendo um purgante horroroso tradicional que curaravam maleitas e dava força:)))))
Véia - velha
mano - termo aplicado tal como cá...compadre, amigo, vizinho
Hum... mbundo kène muxima- natural não tem coração
Depois é uma mistura do português com o pretuguês e imaginem como falava e ainda misturei mais com o brasileiro já que vivi lá:)
Obrigado rapariga por este momento LINDOOOOOOOOOO e agora vou tratar do emparedão das netas.
Uma beijoca a todos
Wind,
Este belíssimo poema de Viriato da Cruz foi musicado por Rui Mingas, que o cantou, e também cantado por Martinho da Vila.
A tradução das palavras já foi dada, e muito bem, por Fatily. Há quem diga que a cola e gengibre eram uma espécie de mata-bicho das gentes do mato. No poema fala-se da mudança desse hábito, em favor do pequeno-almoço à europeia, em Luanda.
Um beijo.
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