terça-feira, novembro 30, 2004

O Poema




O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê

O poema alguém o dirá
Às searas

Sua passagem se confundirá
Com o rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas

(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo.


Sophia de Mello Breyner e Andresen

Foto:Rui Nabais

3 comentários:

lique disse...

A visão de Sophia sobre a universalidade e intemporabilidade do poema que a todos pertence e pode habitar qualquer lugar. Quando sai das mãos de quem escreve, passa a ser de todos os que o acolherem. Beijinho, amiga.

Anónimo disse...

Gosto especialmente de "O poema me levará no tempo/Quando eu já não for eu/E passarei sozinha/Entre as mãos de quem lê". Tem uma beleza arrepiante :) bjs

Anónimo disse...

Valeu ter deixado o "sofá"!
Beijo, Wind e o meu especial obrigada.