domingo, novembro 14, 2004

Fernando Pessoa

"Contemplo o lago mudo"


Contemplo o lago mudo
Que uma brisa estremece.
Não sei se penso em tudo
Ou se tudo me esquece.
O lago nada me diz,
Não sinto a brisa mexê-lo
Não sei se sou feliz
Nem se desejo sê-lo.
Trêmulos vincos risonhos
Na água adormecida.
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única vida?




Foto: Nuno Freitas


"Não quero rosas, desde que haja rosas"


Não quero rosas, desde que haja rosas.
Quero-as só quando não as possa haver.
Que hei-de fazer das coisas
Que qualquer mão pode colher?
Não quero a noite senão quando a aurora
A fez em ouro e azul se diluir.
O que a minha alma ignora
É isso que quero possuir.
Para quê?...Se o soubesse, não faria
Versos para dizer que inda o não sei
Tenho a alma pobre e fria...
Ah, com que esmola a aquecerei?




Foto:Ricardo Cordeiro

Sem comentários: