quinta-feira, novembro 25, 2004
A certeza. O medo
A atenção fixa no relógio. Ficava sempre paralisada quando a hora chegava.
Os gestos tornavam-se mais lentos.
Gestos de medo. Corpo rígido de medo.
Tornava-se só ouvidos, tentando ouvir e decifrar nos passos dele como seria naquele dia.
A vontade de fugir. O medo de fugir.
A impossibilidade da fuga.
Baixou os olhos quando ele entrou.
Tentou tornar-se invisível.
O medo de esboçar um gesto que despoletasse a ira.
O medo de dizer alguma palavra que provocasse a pancada, a agressão.
O medo.
Medo de ficar calada.
Medo de falar.
Ele sentou-se silenciosamente. Não perguntou pelas crianças.
O olhar duro e mau fixo nela.
Ela soube.
Medo de ficar calada.
Medo de falar.
Preparou-se para o golpe que viria a qualquer momento.
A certeza do golpe.
A incerteza do quando.
A vontade de fugir.
A impossibilidade de fugir.
A espera.
O medo.
(Dia 25 de Novembro, dia mundial contra a violência sobre as mulheres)
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5 comentários:
Este texto é extraordinário. Só a Encandescente para nos deixar assim como quem leva um murro e, mesmo assim, sabe que tem que olhar e ler. Muito boa a tua ideia de pôr aqui este texto, hoje. Um beijo, amiga.
encandescente, obrigada pelo texto. Tu não baixas os braços poetisa e não nos deixas baixar:) beijos:)***
Já tinha lido no Erotismo na Cidade e tinha gostado muito. É um grande poema. É mais alguém que nos alerta para essa triste realidade da violência sobre as mulheres. Beijos para as duas.
Texto fantástico pela clareza e nitidez com que descreve o íntimo de uma mulher que é alvo de violência. Um beijo!
saúdo a inciativa, Wind! do poema retenho a palavra "medo"! horrível...
foi um prazer ler de novo a "Encandescente", ainda que por interposta pessoa...
beijos
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