domingo, agosto 22, 2010

Aves/Labaredas



Sobreviver na noite que aprisiona as aves / labaredas
é habitar o corpo vazio de nenúfares brancos.
Subir na água em espiral, nos veios túrgidos da água adolescente,
até encontrar, num reverso lento, a sombra das imagens,
a marca da lua e das serpentes,
como se o coração dançasse na escalada azul que urge
e penetrasse no reino secreto que se desdobra,
numa pedra alquímica, conchas, madrepérola.
Fendas, cicatrizes.

Lírios sinuosos, veias. Violoncelos transparentes.
No fulgor translúcido onde o todo se reinscreve.

No éter cinzelado dos goivos e dos astros,
num acto contínuo, extasiado,

de rumor e silêncio, onde escuto marcas na areia
de seres que vieram pela noite, pela súbita consciência.
Pelas raízes da água, velozes, sedentos,
pelos trilhos do vento, atravessando a sombra, os declives;
a crina ondulante, os cascos em ferida.
A garupa sedosa. A boca liberta pela noite do tempo.
O tempo fendido. As marcas na areia.

A indecifrável profecia seguindo os indícios da luz.
Na figura exacta da aurora
que recupera o corpo de algas e açucenas
nas sombras movediças,
dos cometas fosforescentes que se escoam,

na penumbra suavíssima, de corolas negras,
na noite acordada.

Maria do Sameiro Barroso

Imagem retirada do Google

1 comentário:

Fatyly disse...

Lírios sinuosos, veias. Violoncelos transparentes.
No fulgor translúcido onde o todo se reinscreve.

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Não conhecia e gosteo muito!

Beijocas e um bom domingo