sábado, dezembro 29, 2012

Fingir que está tudo bem



Fingir que está tudo bem: o corpo rasgado e vestido
com roupa passada a ferro, rastos de chamas dentro
do corpo, gritos desesperados sob as conversas: fingir
que está tudo bem: olhas-me e só tu sabes: na rua onde
os nossos olhares se encontram é noite: as pessoas
não imaginam: são tão ridículas as pessoas, tão
desprezíveis: as pessoas falam e não imaginam: nós
olhamo-nos: fingir que está tudo bem: o sangue a ferver
sob a pele igual aos dias antes de tudo, tempestades de
medo nos lábios a sorrir: será que vou morrer?, pergunto
dentro de mim: será que vou morrer? olhas-me e só tu sabes:
ferros em brasa, fogo, silêncio e chuva que não se pode dizer:
amor e morte: fingir que está tudo bem: ter de sorrir: um
oceano que nos queima, um incêndio que nos afoga. 


José Luís Peixoto

Imagem retirada do Google

4 comentários:

Anónimo disse...

Fingir é um sentimento lixado.
Apenas atenuado pela beleza do texto.

Bj

Fatyly disse...

Gosto imenso de José Luís Peixoto e neste texto reflecte bem que quem finge que está tudo bem e ter de sorrir o tempo todo não se sairá bem daí o trocadilho final!

Complicado!

Beijocas

Nilson Barcelli disse...

Fingir é muito mau.
Mas este poema do JLP é muito bom.

Isabel, minha querida amiga, desejo que tenhas um excelente 2013, sem fingir...

Beijo.

Anónimo disse...

Eu acredito que possa haver motivos para fingir, mas uma vez ou outra... agora constantemente não me parece que seja uma boa forma de viver. E quando penso em fijimento vêm-me sempre memórias à tola...

Bom dois mil e "treuze"! :)